Vivemos em um mundo de prioridades concorrentes quando cuidamos de pacientes. Todos os dias, somos persuadidos, pressionados e até incitados a fornecer um atendimento econômico, eficiente e altamente produtivo. Em muitos lugares, quanto mais rápidos e baratos são os serviços de anestesia que fornecemos, mais elogios recebemos de nossos líderes. Em um número excessivo de casos, há menos ênfase na prestação de cuidados seguros porque se presume que os cuidados que prestamos serão seguros. Embora a eficiência e o cuidado seguro possam ser balanceados de maneira eficaz, sabemos que muitos pacientes são prejudicados por cuidados perioperatórios, inclusive anestésicos, quando a pressão para acelerar o fluxo de pacientes é mais enfatizada do que a segurança.
Quando somos pacientes, nossas prioridades muitas vezes podem não corresponder às dos colegas que cuidam de nós. Em geral, como pacientes, tendemos a dar muito valor à segurança no perioperatório. Sim, queremos que nosso atendimento seja eficiente e que nossos resultados cirúrgicos sejam excelentes, mas passar pelo período perioperatório sem complicações ou problemas inesperados também é uma importante prioridade do paciente.
A importância de estabelecer prioridades de segurança do paciente em anestesia
Como uma fundação dedicada à segurança do paciente, a Anesthesia Patient Safety Foundation (APSF) se esforça para ajudar os pacientes a alcançarem sua prioridade de receber cuidados intraoperatórios e perioperatórios seguros. Na última década, os requisitos de treinamento para muitos novos profissionais de anestesia e diversas práticas clínicas nos EUA foram estendidos para todo o espectro de cuidados perioperatórios, evoluindo para aqueles em uma série de outras nações. Essas mudanças nos EUA, juntamente com uma ênfase crescente em caminhos de recuperação aprimorados, criaram oportunidades para aumentar as iniciativas de segurança do paciente durante todo o período perioperatório.
Como consequência, a segurança do paciente em anestesia é agora um tópico notavelmente amplo, variando de aspiração pulmonar na indução da anestesia até questões pós-operatórias, como parada respiratória induzida por opioides, comprometimento cognitivo prolongado e mortalidade pós-operatória em pacientes com deterioração fisiológica aguda. A APSF abraçou essa expansão do escopo da segurança do paciente em anestesia.
A cada ano, os comitês e o Conselho de Diretores da APSF revisam as questões existentes e emergentes de segurança perioperatória do paciente e elaboram a lista das questões de maior prioridade da Fundação. A Tabela 1 fornece uma lista dessas prioridades e ações tomadas pela APSF para promovê-las e melhorá-las durante os últimos 5 anos. Muitas dessas questões requerem um compromisso de longo prazo de recursos e defesa para obter melhorias na segurança do paciente
Tabela 1: Prioridades e atividades em andamento da APSF em 2021 para a segurança perioperatória do paciente.
A lista a seguir contém nossas 10 maiores prioridades e atividades relacionadas.
O resumo das atividades não é exaustivo.
1. 1.Prevenir, detectar e mitigar a deterioração clínica no período perioperatório
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- A.Sistemas de alerta precoce para todos os pacientes perioperatórios
- Monitorização da piora do paciente
- I.Monitorização pós-operatória contínua na enfermaria hospitalar
- Ii.Distúrbio ventilatório induzido por opioides e monitorização
- Sepse precoce
- C.Reconhecimento precoce e resposta ao paciente em descompensação
Atividades da APSF:
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2. Segurança em locais fora da sala de cirurgia, como salas de endoscopia e radiologia intervencionista
Atividades da APSF:
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3. 3.Cultura de segurança: a importância do trabalho em equipe e da promoção de interações do colegiado para apoiar a segurança do paciente
Atividades da APSF:
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4. Segurança de medicamentos
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- A.Efeitos dos medicamentos
- B.Problemas de rotulagem
- Escassez
- D.Problemas tecnológicos (por exemplo, código de barras, RFID)
- E.Processos para evitar e detectar erros
Atividades da APSF:
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5. 5.Delírio perioperatório, disfunção cognitiva e saúde cerebral
Atividades da APSF:
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6. 6.Infecções hospitalares e contaminação e transmissão microbiana ambiental
Atividades da APSF:
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7 7.Problemas de comunicação relacionados ao paciente, transferências de cuidados e transições de atendimento
Atividades da APSF:
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8. 8.Dificuldades, habilidades e equipamentos de manejo das vias aéreas
Atividades da APSF:
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9. Anestesiologistas e burnout
Atividades da APSF:
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10 Distrações nas áreas de procedimentos
Atividades da APSF:
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Usamos essa lista para direcionar o conteúdo do nosso site e do nosso Boletim, além de financiamentos para pesquisas e painéis e fóruns educacionais (como as conferências anuais de Stoelting). Embora várias dessas prioridades sejam específicas para cuidados de anestesia intraoperatória (por exemplo, distrações em áreas de procedimentos), 8 de 10 têm escopos que se estendem por todo o espectro de questões perioperatórias. Um exemplo muito pertinente e oportuno são as infecções hospitalares e a contaminação e transmissão microbiana ambiental (por exemplo, infecção por COVID e suas muitas ramificações nos cuidados intraoperatórios e perioperatórios e na segurança do profissional). A APSF abordou questões relacionadas à pandemia extensivamente em 2020 (https://www.apsf.org/novel-coronavirus-covid-19-resource-center/). Mais de 600 mil pessoas de todos os países do mundo acessaram nosso site e nosso Boletim para obter informações importantes sobre segurança de profissionais e pacientes de COVID durante a pandemia.
A priorização é importante quando há recursos, expertise e tempo limitados. É quando o trabalho em equipe se torna tão importante. Sozinha, nenhuma organização, sistema de saúde ou sociedade profissional pode ter um impacto positivo em todas as questões importantes para a segurança perioperatória do paciente. É necessária uma equipe, com cada integrante fazendo suas próprias contribuições exclusivas em colaboração com outros. É por isso que a APSF e líderes da saúde de todo o mundo discutem continuamente questões de segurança perioperatória do paciente e como podemos trabalhar juntos para resolver essas questões cruciais e priorizadas que são importantes para todos nós. Isso inclui todos os anestesiologistas que prestam cuidados ao paciente.
O que você e os grupos nos quais tem influência podem fazer para melhorar a segurança perioperatória do paciente? Cabe a cada um de nós perguntar o que podemos fazer pessoalmente e juntos dentro da especialidade e fora dela para fazer a diferença. Isso inclui sair de nossas zonas de conforto usuais da prática clínica e buscar oportunidades para trabalhar com outras pessoas envolvidas no espectro de cuidados perioperatórios. Para a APSF especificamente, esse esforço incluiu desenvolver nossas redes sociais, como Facebook, Twitter e Instagram, para alcançar profissionais de anestesia em todo o mundo que, de outra forma, não estariam cientes de nossas prioridades e iniciativas de segurança do paciente. Temos uma iniciativa de podcast de sucesso notável (https://www.apsf.org/anesthesia-patient-safety-podcast/ que fornece atualizações importantes sobre a segurança do paciente em anestesia em variados tópicos, incluindo as prioridades que definimos.
Bem-estar profissional: Uma importante nova prioridade da APSF
Um número crescente de publicações relata que é importante que nossos colegas anestesiologistas se sintam seguros, porque colegas debilitados aumentam o risco de danos ao paciente. Os danos ao paciente associados a profissionais debilitados é um problema crescente decorrente do aumento do estresse e dos riscos pessoais à saúde dos profissionais de anestesia. O estresse associado à atual pandemia da COVID fornece um bom exemplo. Por exemplo, o registro intubateCOVID, parcialmente apoiado pela APSF, descreveu em julho de 2020 que há um risco de 3,1% de novos casos de COVID-19 confirmados em laboratório e um risco de 8,4% de novos sintomas que exigem autoisolamento ou hospitalização em profissionais de saúde que intubaram pacientes com suspeita ou confirmação de infecção por COVID-19. (https://www.apsf.org/news-updates/the-intubatecovid-global-registry-describes-risk-of-covid-19-outcomes-in-health).
A APSF reconheceu a necessidade de integrar o bem-estar do profissional de anestesia à visão de nossa fundação. Nossa visão anteriormente era que “nenhum paciente deve ser prejudicado pela anestesia”. Atualmente, ela declara que “ninguém deve ser prejudicado por cuidados anestésicos”. Essa versão mais recente incorpora o bem-estar dos colegas anestesiologistas à nossa visão e estende nosso papel além da segurança tradicional do paciente no intraoperatório.
A Conferência de Consenso de Stoelting de 2021, a ser realizada em 8 e 9 de setembro, se concentrará especificamente no bem-estar do profissional de anestesia e seu potencial impacto negativo na segurança do paciente. Essa conferência discutirá possíveis intervenções para reduzir os danos ao paciente e ao profissional e oferecerá recomendações para implementar as melhores delas.
Priorização da segurança do paciente em anestesia: Todos contam
A APSF tem a sorte de trabalhar em estreita colaboração com parceiros em todo o mundo para defender a segurança do paciente em anestesia. Embora a fundação possa estimular discussões, promover a geração de novos conhecimentos relacionados a questões prioritárias de segurança no perioperatório e desenvolver recomendações de consenso, é necessário que todos trabalhem juntos para defender a segurança do paciente em anestesia. Agradecemos o grande esforço e as contribuições de parceiros como a World Federation of Societies of Anaesthesiologists (WFSA); sociedades regionais, como a European Society of Anesthesiologists, a Confederation of Latin American Societies of Anaesthesiology e outras; e muitas sociedades nacionais de anestesia que têm sido os principais líderes na segurança do paciente em anestesia.
Exemplos dessas colaborações nos últimos anos incluem nosso trabalho com as sociedades nacionais de anestesiologia no Japão, China, Brasil, Portugal, Espanha, França, Colômbia, México e outros países para publicar edições traduzidas do Boletim da APSF. O Boletim agora está disponível em cinco idiomas traduzidos, o que nos permite alcançar uma parcela ampliada de profissionais de anestesia do mundo. A APSF tem apoiado projetos de pesquisa educacional sobre segurança do paciente com a WFSA e a Patient Safety Movement Foundation. Esses projetos educacionais levarão a um treinamento aprimorado de subespecialidades em países com poucos recursos e ao desenvolvimento e implementação de currículos de segurança do paciente específicos à anestesia em programas de treinamento e educação contínua de anestesiologistas. Colaboramos com bolsas de pesquisa clínica de segurança do paciente para a Foundation for Anesthesia Education and Research e a Orthopaedic Research and Education Foundation a fim de criar a próxima geração de cientistas clínicos no campo de segurança do paciente em anestesia.
É a união desses grupos e suas contribuições colaborativas que causam grandes impactos. Por favor, apoie seus esforços. No entanto, e de maior importância, defenda pessoalmente a segurança do paciente todos os dias e de todas as maneiras. É a coisa certa a fazer pelos nossos pacientes. E essa defesa pessoal conjunta é o componente de maior impacto positivo na segurança do paciente em anestesia.
Mark Warner, MD, é o atual presidente da APSF e o professor Annenberg de Anestesiologia da Mayo Clinic, Rochester, Minnesota, EUA.
O autor não apresenta conflitos de interesse.